abril 14, 2009

just give me a second

Não sei, não sei, não sei.
Repetia e repetia e, cada vez que pensava, sentia a angústia aumentar, mas, de fato, não sabia.

are you happy with yourself?

Escovava os dentes amarelados de tantos cigarros e cafés e pensava que tinha olhos de fracassado. Talvez fosse, mas não tinha certeza.
Ainda era cedo, costumavam dizer, ainda era cedo e há uma vida inteira pela frente. Nada é definitivo, então escove os malditos dentes e vista-se para ir procurar um bom emprego. Cuspiu a água cheia de espuma na pia e pensou em fazer a barba, mas não agora, não às três da tarde de uma segunda-feira quente, não aquela altura de uma vida perdida. Jogou água gelada no rosto e se encarou outra vez no espelho, vendo seu rosto pálido e molhado sem nenhuma expressão. Puxou a toalha fina e secou-se, jogando-a sobre o armarinho do banheiro, sem qualquer preocupação, batendo a porta e correndo os olhos pelo apartamento de dois cômodos que era tão caro para algo tão pequeno, mas estamos na capital, meu bem. O custo de vida não é para você, você devia ter ficado lá, na casa da sua mãezinha enquanto fingia que era um escritor de uma cidade interiorana qualquer.
Ele suspirou.
Precisava de café, mas sabia que todo o pó havia acabado numa dessas noites insones em que ficava observando a vida da metrópole da janela de seu pequeno apartamentinho de aluguéis atrasados. Precisava de café e, talvez, de uma vida, mas não tinha certeza se encontraria algo decente nas parateleiras mal cuidadas do mercadinho da esquina. Pegou o jeans velho da guarda da cadeira, tateando os bolso atrás de dinheiro. Não encontrou nada e jogou-se no sofá-cama não tão macio assim, sentindo as costas doerem logo em seguida. Tateou o maço de cigarros do lado do sofá e o isqueiro.
Acendeu e, por um momento, esperou. Não sabia pelo que, mas sabia que não aconteceria. Tragou com força e quase desespero, expulsando o gosto da pasta de dentes barata enquanto soprava devagar a fumaça do último cigarro.

abril 07, 2009

ecos.

Vezenquando você levanta de manhã como se deixasse um pedaço de si mesmo na cama. Um pedaço pequeno, escondido entre os lençóis. Um pedaço que acabará, invevitavelmente, escorregando para baixo da cama e sendo esquecido para sempre. Ou pelo menos até você perceber o que está faltando e aprender onde é que aquele pedaço cheio de pó encaixa.
Vezenquando você nem levanta de manhã porque você sabe que terá perdido pedaços demais até chegar ao banheiro antes mesmo de poder dizer a si mesmo que deve ir em frente enquanto evita seus olhos no espelho.

abril 06, 2009

Atrasos.

Todo o cansaço de si mesma espalhava-se por seu corpo devagar, sendo aos poucos regado pelo sangue filtrado.

Sístole.

A vida pára.

Diástole.

Ei, você perdeu a chance. Sinto muito, entre na fila novamente.

O tédio antigo de muitos domingos desocupados cobria tudo, inclusive ela, como uma fina e irremovível camada de poeira. Mas poeira nunca pareceu pesar tanto como aquela exaustão da própria vida pesava sobre sua cabeça, forçando-a para o chão ou abaixo dele, não sabia. Apenas esticava as pernas sobre as almofadas macias e espreguiçava-se, mexendo-se lenta sob pressão de ser.

Fingia.

Seus dedos procuravam em vão pelos bolsos algum resto de amor próprio sempre perdido nunca encontrado. Suspirava, desejando fumar, mas não havia cigarro. Lembrava-se de ter fumado o último enquanto esperava o ônibus, amassada entre ocupações e atrasos, entre pessoas e pessoas.

Monstros.

Não aceitava que sua própria espécie pudesse causar-lhe tanto nojo e desprezo.

Não queria.

Sentia-se monstruosa nas manhãs eternas das segundas-feiras. Cansada de ser apenas ou cansada de fingir que nunca fingia.

Fumava.

Um ou dois, talvez, nove ou dez cigarros rápidos e estressados enquanto se re-adaptava ao caos diário. Tremia, tremia muito enquanto tinha uma vida. Conversava, mentia, aceitava. Nada seria ou teria sido como algum dia ela esperou.
Sístole.

Você cansa.

Diástole.

Você é jogado de volta.